29 de outubro de 2012

"Terra, Sangue e Mortos"

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Assim descrevia o Bispo do Porto o povo do norte e, em geral, o povo português, numa conferência a missionários. Este conhecimento tão profundo da idiossincrasia do povo português não parece ter sido bem traduzido pelos próprios bispos quando preferiram manter como feriado nacional a Assunção da Nossa Senhora em detrimento do dia de Todos os Santos.

O dizer isto não me faz suspeito de ser um desses clérigos que pensam que a expressão do amor e da gratidão à nossa Mãe do Céu nos faz menos Cristocêntricos. Rezo o terço todos os dias e sempre no fim da missa convido o povo, através de uma ave-maria, a agradecer àquela por quem nos veio o pão descido do Céu e a palavra incarnada de Deus, Cristo.

Já vivi e visitei muitos países do mundo católico e em nenhum povo vi um culto aos mortos como o dos Portugueses, tanto em Portugal como fora de Portugal, nas comunidades espalhadas pelo mundo inteiro. O nosso povo é tão generoso que, depois de mandar celebrar uma missa pelos seus entes queridos, acrescenta sempre mais uma missa pelas almas mais abandonadas do Purgatório - aquelas que não têm ninguém vivo que se lembre delas. Ao abolir este feriado não se estará a dar a Igreja um tiro no pé?

Fiéis defuntos e Todos os Santos que o feriado unia, por razões de conveniência do povo, são a expressão da Comunhão dos Santos expressa no Credo dos Apóstolos. Na minha terra, Loriga, e em muitas terras do nosso país, o povo expressa essa mesma Comunhão dos Santos na Romaria comunitária ao cemitério. Ir à terra pelos Santos é equiparado ao ir à terra pelo Natal e pela Páscoa.

A festa de Todos os Santos era a nossa festa… a única no calendário litúrgico que fazia jus e celebrava o esforço, não beatificado nem canonizado, de tantos cristãos que, no seu dia-a-dia, buscam configurar-se mais a Cristo respondendo ao apelo “sede perfeitos como é perfeito o vosso Pai celeste.” Mateus, 5, 48

No mundo civil em assuntos de interesse geral os governos consultam o povo em referendo; “Voz do povo, voz de Deus”. Celebramos este ano os 50 anos do Concílio Vaticano II: um concílio que fez da Igreja menos piramidal e mais circular; menos hierárquica e mais de comunhão,  menos eclesiástica e mais popular. Não podia o povo ter sido consultado de alguma forma? Afinal, a festa de todos os santos e santas de Deus era o nosso equivalente à tumba do soldado desconhecido que todos os países têm e mantêm com orgulho.
Pe. Jorge Amaro, IMC

24 de outubro de 2012

Riqueza que gera pobreza

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 A escola secundaria do concelho de Amares distrito de Braga, celebrou este ano com grande enfâse o 17 de Outubro – dia internacional da erradicação da pobreza. Neste contexto fui convidado para ajudar na sensibilização dos alunos sobre este tema que é um dos objectivos do Milénio.

Se a população mundial perto dos 7 milhões de pessoas, consumisse, e poluísse tanto como os europeus americanos e o resto dos países ricos consomem e poluem, este nosso planeta só podia sustentar a nossa vida por 3 meses ou então precisaríamos dos recursos de 10 planetas como o nosso.

O nível de pobreza em que vive 80% da população não é justo nem é saudável; ainda há muita mortalidade infantil, ainda se morre de malária, de tuberculose, de lepra, de tifo e outras doenças infecciosas; doenças para as quais há muito tempo que há cura.

Por outro lado também não é justo nem é saudável o nível de vida de 20% da humanidade; é o nosso nível de vida que nos faz morrer de cancro, Alzheimer, Parkinson, Diabetes, doenças cardiovasculares e muitas outras

Uns morrem da pobreza e outros morrem da fartura. Não está o mundo globalizado? E não é a globalização algo assim como o princípio dos vasos comunicantes? – Duas tinas de água, uma meia cheia, outra meia vazia quando se comunicam ficam niveladas? Porque é que isto não acontece?

Porque o primeiro mundo aplicou ao canal de intercomunicação uma válvula para que o movimento se faça num só sentido….

Se nós descêssemos do nosso nível de vida e os pobres subissem, todos viviam melhor com mais justiça e saúde; nem eles morriam das doenças da pobreza nem nós das doenças da riqueza; mas como nós não queremos descer do nosso nível de vida então temos que arranjar mecanismos para que eles sejam sempre pobres. Morra Marta morra farta…
Pe. Jorge Amaro, IMC

19 de outubro de 2012

Ano da Fé

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¿Qué tengo yo, que mi amistad procuras?
¿Qué interés se te sigue, Jesús mío,
que a mi puerta, cubierto de rocío,
pasas las noches del invierno oscuras?

¡Oh, cuánto fueron mis entrañas duras,
pues no te abrí! ¡Qué extraño desvarío,
si de mi ingratitud el hielo frío
secó las llagas de tus plantas puras!

¡Cuántas veces el ángel me decía:
«Alma, asómate ahora a la ventana,
verás con cuánto amor llamar porfía»!

¡Y cuántas, hermosura soberana,
«Mañana le abriremos», respondía,
para lo mismo responder mañana!
Lope de Vega

Sempre ouvimos dizer que a fé é um dom de Deus e assim é de certa forma pois como diz São Paulo é o Espírito Santo que grita dentro de nós Aba Pai (Gálatas 4,6); ou como diz Jesus em João 15, 16, “Não foste vós que me escolhestes, fui eu que vos escolhi…”; No entanto, se a fé é fundamentalmente um dom de Deus, não seria Deus injusto porque não deu esse dom aos que se dizem ateus ou agnósticos?

Deus só ama os que o amam, gosto eu de repetir retoricamente nos meus sermões. É claro que é falso mas só é falso em teoria na prática é como se fosse verdadeiro. O que nos aquece não é o sol diretamente mas sim o feedback ou resposta da terra. De facto quanto mais alto e longe da terra estivermos mais frio temos (já todos vimos nos painéis informativos que a temperatura exterior de um avião que vai a 10.000 metros de altitude é de 50 graus negativos).

A salvação é gratuita mas não é automática; Deus alimenta as aves do céu mas não lhes deita a comida no ninho; elas têm que procurá-la. O que nos salva não é tanto a fé como dom de Deus mas sim a fé como opção e como resposta ao dom de Deus. Deus ama a toda a gente por igual; amava a Hitler e a Francisco de Assis da mesma maneira. A diferença entre estes reside na sua resposta ao dom de Deus: negativa no primeiro, positiva no segundo.
Pe. Jorge Amaro, IMC

10 de outubro de 2012

Animação Missionária ou Missão?

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Nos tempos em que a Europa era maioritariamente cristã, fazia sentido que os Institutos Missionários Ad Gentes conscientizassem o povo de Deus de que a Igreja não existe para si mesma, mas para a Missão e que o objectivo da Missão é a construção do Reino de Deus. Em virtude desta Animação Missionaria do povo de Deus a Europa levou o evangelho aos quatro cantos do mundo.

Ainda mantendo uma cosmovisão cristã a Europa já não é cristã. Para ser missionário é preciso ser crente; não se pode fazer Animação Missionaria entre os não crentes; entre os não crentes o que se faz é Missão.

Ninguém dá o que não tem; não podemos exortar a partilhar a fé, a ser missionário, a quem não acredita, ou duvida ou tem uma fé débil. Por isso aqui e agora a melhor maneira de fazer Animação Missionaria é fazer Missão, e o melhor testemunho missionário é ser aqui e agora o que fomos antes lá longe. Alguém dizia que a melhor forma de honrar um pai é ser um bom pai.

Diminuíram os fiéis e diminuíram ainda mais os sacerdotes mas não diminuíram os lugares de culto. Os poucos pastores de agora acumulam várias paróquias e estão absorvidos numa pastoral de manutenção de um rebanho pequeno e disperso. Face a este problema, muitos membros de Institutos missionários Ad Gentes, trocaram as redes pelo cajado.

É a pastorear as poucas ovelhas que quedam que preenchemos o vazio das muitas que abandonaram o rebanho? Os que somos pescadores devemos adaptar os anzóis, redes e técnicas de pesca à nova situação não mudar de profissão; não podemos deixar de ser o que somos por vocação. Mas se tivéssemos que ser pastores ao menos deveríamos ser Bons Pastores, e o bom pastor parece-se ao pescador pois é o que deixa as 99 para ir em busca da ovelha perdida.
Pe. Jorge Amaro, IMC

1 de outubro de 2012

Cabeçalho da Missão Itinerante

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O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu para anunciar a Boa-Nova aos pobres; enviou-me a proclamar a libertação aos cativos e, aos cegos, a recuperação da vista; a mandar em liberdade os oprimidos.  Lucas 4,18

A Pomba – Representa, como é óbvio, o Espírito Santo. A missão é trinitária porque começou com Deus Pai ao enviar o seu filho e é continuada no “aqui agora” da humanidade pelo Espírito Santo que é quem anima, inspira, dá força e coragem ao Corpo Místico de Cristo que é a Igreja. O Autor e Proprietário desta empresa, a Missão, é sempre Deus.

Os arautos -  Sem duas túnicas, pão, dinheiro e alforge como requer Jesus em Mateus (10, 10) e Lucas (9, 3)  mas, à diferença destes,  com cajado e sandálias como requer Jesus em Marcos (6, 8-9) para facilitar o caminho e poderem ir mais depressa.

A cidade – É onde a maior parte da população mundial vive hoje; centro do poder e do governo até dos que ali não vivem. Para melhor difundir a Boa Nova, Pedro e Paulo assentaram arraiais em Roma; os apóstolos da actualidade também devem levar o sal e a luz do evangelho aos centros do poder e decisão do mundo de hoje.

O círio pascal - É o “i” de Missão e o “i” de itinerante. Representa a notícia de que os arautos são portadores; a fé em Cristo morto e Ressuscitado; Alfa e Ómega, principio e fim do Universo; caminho verdade e vida; a resposta mais razoável e convincente às perguntas que toda a pessoa que vem a este mundo se faz: De onde venho? Para onde vou? Que sentido tem a vida? Os que dizem que vêm do nada e vão para o nada que resposta podem dar à terceira pergunta?

“Ide primeiro às ovelhas perdidas da casa de Israel” (Mateus 10, 6) - A Europa era toda cristã quando extravasou o evangelho para os outros continentes; hoje não só não o é como até renega as suas raízes cristãs. Re-evangelizar a Cultura ocidental, que continua a exercer poder e influencia sobre o mundo, é certamente uma forma de Missão Ad gentes.

                                                                                                                          Pe. Jorge Amaro, IMC